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sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Revolução Farroupilha, o início

Guilherme Litran, Carga de cavalaria Farroupilha, acervo do Museu Júlio de Castilhos.
Guerra dos Farrapos ou Revolução Farroupilha são os nomes pelos quais ficou conhecida a revolução ou guerra regional, de caráter republicano, contra o governo imperial do Brasil, na então província de São Pedro do Rio Grande do Sul, e que resultou na declaração de independência da província como estado republicano, dando origem à República Rio-Grandense. Estendeu-se de 20 de setembro de 1835 a 1 de março de 1845.
A revolução, que originalmente não tinha caráter separatista, influenciou movimentos que ocorreram em outras províncias brasileiras: irradiando influência para a Revolução Liberal que viria a ocorrer em São Paulo em 1842 e para a Revolta denominada Sabinada na Bahia em 1837, ambas de ideologia do Partido Liberal da época, moldado nas Lojas Maçônicas. Inspirou-se na recém-finda guerra de independência do Uruguai, mantendo conexões com a nova república do Rio da Prata, além de províncias independentes argentinas, como Corrientes e Santa Fé. Chegou a expandir-se à costa brasileira, em Laguna, com a proclamação da República Juliana e ao planalto catarinense de Lages. Teve como líderes: Bento Gonçalves, General Neto, Onofre Pires, Lucas de Oliveira, Vicente da Fontoura, Pedro Boticário, Davi Canabarro, Teixeira Nunes, Vicente Ferrer de Almeida, José Mariano de Mattos, além de receber inspiração ideológica de italianos carbonários refugiados, como o cientista Tito Lívio Zambeccari e o jornalista Luigi Rossetti, além de Giuseppe Garibaldi, que embora não pertencesse a carbonária, esteve envolvido em movimentos republicanos na Itália. A questão da abolição da escravatura também esteve envolvida, organizando-se exércitos contando com homens negros que aspiravam à liberdade.
Antecedentes e causas
Trecho do quadro A batalha dos Farrapos, de Wasth Rodrigues.

A justificativa original para a revolta baseia-se no conflito político entre os liberais, que propugnavam modelo de estado com maior autonomia às províncias, e o modelo imposto pela constituição de D. Pedro I, de caráter unitário. Além disso, havia disseminação de ideais separatistas, tidos por muitos gaúchos como o melhor caminho para a paz e a prosperidade, seguindo o exemplo da Província Cisplatina.
O movimento também encontrou forças na posição secundária, tanto econômica como política, que a Província de São Pedro do Rio Grande ocupava no Brasil, nos anos que se sucederam à Independência. Diferentemente de outras províncias, cuja produção de gêneros primários se voltava para o mercado externo, como o açúcar e o café, a do Rio Grande do Sul produzia principalmente para o mercado interno. Seus principais produtos eram o charque e o couro, altamente tributados. As charqueadas produziam para a alimentação dos escravos africanos, indo em grande quantidade para abastecer a atividade mineradora nas Minas Gerais, para as plantações de cana-de-açúcar e para a região sudeste, onde se iniciava a cafeicultura. A região, desse modo, encontrava-se muito dependente do mercado brasileiro de charque, que com o câmbio supervalorizado, e benefícios tarifários, podia importar o produto por custo mais baixo. Além disso, instalava-se nas Províncias Unidas do Rio da Prata, uma forte indústria saladeiril, da qual participava Rosas, e que, junto com os saladeros do Uruguai (que deixara de ser brasileiro) competiria pela compra de gado da região, pondo em risco a viabilidade econômica das charqueadas sul-riograndenses. Consequentemente, o charque rio-grandense tinha preço maior do que o similar oriundo da Argentina e do Uruguai, perdendo assim competitividade no mercado interno. A tributação da concorrência externa era uma exigência dos estancieiros e charqueadores. Essa tributação não era do interesse dos principais compradores brasileiros que eram os que detinham as concessões das lavras de mineração, os produtores de cana-de-açúcar e os cafeicultores, pois veriam reduzida a lucratividade das mesmas, por maior dispêndio na manutenção dos escravos.
Há que considerar, ainda, que o Rio Grande do Sul era região fronteiriça aos domínios hispânicos situados na região platina. Devido às disputas territoriais nessa área, nunca fora uma Capitania Hereditária no período colonial e, sim, parte de seu território, desde o século XVII ocupado por um sistema de concessão de terras a chefes militares. Esses dispunham de capacidade de opor-se militarmente ao fraco exército imperial na região. Ainda mais, na então ainda recente e desastrosa Guerra da Cisplatina, que culminou com a perda da área territorial do Uruguai, anteriormente anexada ao Brasil, as posições dos militares e caudilhos locais foram sobrepujadas por comandos oriundos da corte imperial (como o Marquês de Barbacena). Os contatos frequentes, inclusive negócios do outro lado da fronteira, mostraram aos caudilhos locais as vantagens de uma república, com suas bandeiras de igualdade, liberdade e fraternidade trazidas da Revolução Francesa. Além disso a imposição de presidentes provinciais por parte do Governo imperial ia contra o direcionamento político da Assembleia Legislativa Provincial do Rio Grande do Sul, criando mais um motivo de desagrado da elite regional.
Também é preciso citar o conflito ideológico presente no Rio Grande do Sul que havia sofrido diversas tentativas menores de criação de uma república, iniciando com as tentativas insanas de Alexandre Luís de Queirós e Vasconcelos que proclamou a república três vezes no início do século XIX, ou a Sedição de 1830, que visava substituir a monarquia pela república em Porto Alegre e que teve a participação de diversos imigrantes alemães (Otto Heise, Samuel Kerst e Gaspar Stephanousky), mas foi prontamente sufocada .
O descontentamento reinante na província foi objeto de diversas reuniões governamentais, especialmente a partir de 1831, quando começam a circular insistentes boatos sobre a separação da província visando unir-se ao Estado Oriental, também preocupados com informações de que, na fronteira, se pregava a revolução, sendo prometida a liberdade aos escravos. No Uruguai vivia refugiado o padre Caldas, revolucionário da confederação do Equador, que mantinha um jornal de idéias republicanas, além de animada correspondência com os comandantes da fronteira, incluindo Bento Gonçalves.
O conflito ideológico foi exacerbado com a criação da Sociedade Militar, no Rio de Janeiro, um clube com simpatia pelo Império e fomentador da restauração de D. Pedro I no trono brasileiro. Um dos seus líderes foi o Conde de Rio Pardo, que ao chegar a Porto Alegre em outubro de 1833, fundou ali uma filial. Os estancieiros rio-grandenses não viam com bons olhos a Sociedade Militar e pediam que o governo provincial a colocasse na ilegalidade. Entre os protestos eclodiu uma rebelião popular, liderada pelos majores José Mariano de Matos e João Manuel de Lima e Silva que foi logo abafada e seus líderes punidos.

Os Farrapos
Farrapos ou farroupilhas foram chamados todos os que se revoltaram contra o governo imperial, e que culminou com a Proclamação da República Rio-Grandense. Era termo considerado originalmente pejorativo, já utilizado pelo menos uma década antes da Guerra dos Farrapos para designar os sul-riograndenses vinculados ao Partido Liberal, oposicionistas e radicais ao governo central, destacando-se os chamados jurujubas. O termo, oriundo do parlamento, com o tempo foi adotado pelos próprios revolucionários, de forma semelhante à que ocorreu com os sans-cullotes à época da Revolução Francesa. Seus oponentes imperiais eram por eles chamados de caramurus ou camelos, termo jocoso em geral aplicado aos membros do Partido Restaurador no Parlamento Imperial.
Em 1831, no Rio de Janeiro, havia os jornais Jurujuba dos Farroupilhas e Matraca dos Farroupilhas. Em 1832 foi fundado o Partido Farroupilha pelo tenente Luís José dos Reis Alpoim, deportado do Rio para Porto Alegre. O grupo se encontrava na casa do major João Manuel de Lima e Silva(tio de Luís Alves de Lima e Silva, que viria a ser o Duque de Caxias), casa esta que era sede também da Sociedade Continentino. Em 24 de outubro de 1833, os farroupilhas promoveram um levante contra a instalação da Sociedade Militar em Porto Alegre.
Inicialmente, reivindicavam a retirada de todos os portugueses que se mantinham nos mais altos cargos do Império e do Exército, mesmo depois da Independência, respaldados pelo Partido Restaurador ou caramuru. Os caramurus almejavam a volta de D. Pedro I ao governo do Brasil.
No entanto, é bom notar que entre os farrapos havia os que acreditavam que só tornando suas províncias independentes poderiam obter uma "sociedade chula", ou seja, administrada por provincianos. Havia, portanto, estancieiros, estancieiros-militares, farroupilhas-libertários, militares-libertários, estancieiros-farroupilhas, abolicionistas e escravos que buscavam a liberdade, e assim por diante, numa combinação e interpenetração ideológica sem fim. Inicialmente nem todos eram republicanos e separatistas, mas os acontecimentos e os novos rumos do movimento conduziram a esse desfecho. A maçonaria sulista teve importante papel nos rumos tomados, tendendo aos ideais republicanos.

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