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quarta-feira, 18 de junho de 2014

DIÁRIO DE BORDO 1500 - O FINAL?

“O mar – a fronteira final. Estas são as viagens das nau marítima ‘NINAPINTASANTAMARIA’ em sua missão de cinco anos para explorar novos mundos, novas civilizações, corajosamente indo onde homem algum jamais esteve”. Anteriormente, no sábado, data estelar de quatorze de março de mil e quinhentos havíamos ultrapassado as ilhas Canárias, colonizadas e conquistadas em definitivo em 1496”. Entre as oito e nove horas, nos achávamos perto a Grã-Canária, onde andamos todo aquele dia em calma, à vista delas, obra de três ou quatro léguas”, ditou Pero Vaz. Na data estelar de vinte e um de abril de mil e quinhentos, terça-feira das Oitavas de Páscoa, estando da ilha aproximadamente 670 léguas, segundo os pilotos, avistou-se muita quantidade de ervas compridas, chamadas pelos marujos de Botelho, assim como outras chamadas de rabo-de-asno e posteriormente, na quarta-feira seguinte, pela manhã, avistamos aves marítimas chamadas de furabuchos e, a partir da nau capitânia e no amanhecer da data estelar de vinte e dois de abril de mil e quinhentos, segundo assentamento do astrônomo, um pouco ao sul de terras descobertas por Cristóvão Colombo em 1942 e provavelmente aquém da Linha de Tordesilhas, avistou-se sinais de terra, um “monte, mui alto e redondo”, com aproximadamente quinhentos e poucos metros acima da linha do horizonte, justamente na época de Páscoa, uma ilha. 

“Neste mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! A saber, primeiramente, de um grande monte, muito alto e redondo, e de outras serras mais baixas ao sul dele, e de terra chã, com grandes arvoredos, , ao qual monte alto o capitão pôs o nome de O Monte Pascoal e à terra A Ilha de Vera Cruz!”escreveria o porta-voz oficial, Pero Vaz de Caminha. Os cartógrafos, com as limitações da época disseram que tratava-se de uma grande ilha no caminho para as ilhas Molucas, na Oceania, no futuro um dos marcos demarcatórios do tratado de Tordesilhas, e para as Índias orientais. Na quinta-feira, o comandante mandou lançar o prumo.

“Mediram vinte e cinco braças: e ao sol posto, obra de seis léguas da terra, surgimos ancoras, em dezenove braças, - ancoragem limpa,”- escreveu Pero Vaz. Permanecemos ancorados toda noite. Na manhã seguinte, fizemos vela e seguiram os navios pequenos à frente, à direita da costa, até meia légua da terra, onde lançamos ancoras junto a um rio, aproximadamente às dez horas. Pela primeira vez avistamos nativos, sete ou oito. 

Reunidos todos os capitães das naus com o capitão-mor, decidiram enviar Nicolau Coelho para verificar o rio. Aproveitando os Ventos Alísios, úmidos e que ocorrem durante todo o ano nas regiões tropicais, e provocam chuvas e calmarias influenciando o clima das regiões costeiras e de baixa latitude, a esquadra bordejou a costa em direção ao norte, buscando uma enseada, encontrando um recife com um porto, muito bom e seguro, com uma larga entrada, pouco antes do pôr-do-sol do dia 24 de abril, cujo nome prestou homenagem ao destemido descobridor, Baía Cabrália. 

Afonso Lopes, nosso piloto, em um navio pequeno aportou à costa em um esquife, levando, à noite, dois nativos ao capitão em sua nau, recebidos na nau de Cabral pelo Capitão da armada Sancho de Tovar, nobre português de ascendência castelhana, o Capitão Simão de Miranda, de família enobrecida, Nicolau Coelho, navegador, Aires Correia, feitor geral da armada e por Pero Vaz. Dia vinte e cinco, sábado, o Capitão ordenou a entrada de todas as naus na Baía. Designou Nicolau Coelho, Bartolomeu Dias e um mancebo degredado de nome Afonso Ribeiro para ficar com os nativos. Assim que chegamos a praia encontramos 200 homens. A 26 de abril, domingo de Pascoela, pela manhã, Frei Henrique Soares auxiliado pelos outros padres e sacerdotes rezou uma missa de ação de graças, numa pequena ilha, por eles chamada Coroa Vermelha, e o capitão ostentando a bandeira de Cristo, com que saiu de Belém. 

Após a missa, o padre fez uma solene pregação da história do Evangelho, e ao fim tratou de nossa vinda e achamento desta terra. Em vinte e sete de abril, mestre João, médico, astrônomo, astrólogo e físico espanhol desceu à terra firme, onde fez observações astronômicas, identificando pela primeira vez a constelação do Cruzeiro do Sul, e sugerindo ao rei de Portugal em carta a ser enviada no dia vinte e oito que localizasse nos mapas a constelação, e dessa forma faria crer a todos que os portugueses já conheciam o território. Diogo Dias e o degredado Afonso Ribeiro que ficaram dois dias em terra com os nativos retornaram na noite de quarta-feira, vinte e nove de abril. 

Transferiram-se então para o continente, onde asseguraram a posse da terra com outra missa, rezada com a presença dos índios ali encontrados, a 1° de maio, sexta-feira.

Aproxima-se a hora da partida, e em conversa com meu mentor, Pero Vaz de Caminha, decidimos que devo permanecer na ilha para elaborar um levantamento das tribos indígenas, suas características e peculiaridades, relatando em diários minhas andanças pela ilha. Portanto, encerramos daqui nossas transmissões, agradecendo pela atenção dispensada. Como última informação digo que tendo dado por concluída a sua missão ali, Cabral partirá no dia seguinte para a Índia, mandando ao mesmo tempo uma caravela comandada por Gaspar de Lemos com notícias da descoberta para o rei de Portugal. Será uma carta, escrita por Pêro Vaz de Caminha. Ao deixarem o local em direção à Índia, Cabral, na incerteza se a terra descoberta trata-se de um continente ou de uma grande ilha, alterou o nome para ilha de Vera Cruz. Ficam comigo, dois degredados e dois grumetes que desertaram.

Agradecemos imensamente a participação de nosso correspondente a bordo da expedição, e desejamos toda a sorte para ele nessa nova aventura. Vamos ter que fazer uma modificação em nossa programação inicial, interrompendo a transmissão de bordo. Retomaremos o contato com nosso correspondente nas Índias, que lá se encontra para relatar a última fase da viagem.

Para finalizarmos esta etapa de nossa cobertura, vamos propor uma mesa redonda com uma equipe de especialistas de diferentes áreas sobre a descoberta dessa terra nova. Aproveitamos para sugerir que nossos leitores manifestem-se a respeito do novo nome desta terra descoberta por nossos desbravadores. Faremos uma votação popular para escolha.

Bem senhores, podemos começar este debate. Quais seriam as conseqüências desta descoberta? Elas teriam o significado esperado pelos nossos governantes?
−Inicialmente, agradeço pelo convite. Acredito que, politicamente, esta conquista é de suma importância para o desenvolvimento de nossas fronteiras. É muito importante, após a assinatura do Tratado de Tordesilhas, geopoliticamente, instalar um posto avançado no caminho das Índias, considerando além da presença de espanhóis, também a presença de mouros sem falar no aspecto econômico, com a possibilidade de desenvolver a agricultura, utilização como entreposto comercial, colonização, exploração das riquezas naturais, escambo, Outro aspecto a considerar é a expressão “Descobrimento”, pois se confirmada a presença de nativos no local, seriam estes povos indígenas os verdadeiros descobridores, e os portugueses seriam os conquistadores da terra.

−Gostaria de continuar neste assunto, falando um pouco do que se convencionou chamar de “Período das grandes navegações”. Portugueses e espanhóis se lançaram aos Oceanos Pacífico, Índico e Atlântico com o objetivo de descobrir nova rota marítima para as Índias e encontrar novas terras. O primeiro objetivo visava quebrar a hegemonia dos italianos sobre as especiarias e o Mar Mediterrâneo, acesso às Índias. O segundo objetivo seria a conquista de novas terras, para obtenção de matérias-primas, metais preciosos e produtos não encontrados na Europa e, para a Igreja Católica, obtenção de novos fiéis. Para os reis, o aumento do comércio significaria aumento na arrecadação de impostos, mais renda e, conseqüentemente, maior poder. Com a nossa experiência em navegações, inicialmente na pesca, o desenvolvimento da ciência náutica e construção de navios, associado aos investimentos de capital da nossa burguesia e nobreza, muito interessadas nos lucros que as navegações poderiam gerar, era natural que assumíssemos o pioneirismo nas navegações do nosso século.

−Outra qualidade desta expedição é o fato de desmistificar alguns dos medos que tem acompanhado a navegação por mares desconhecido, principalmente o “Tenebroso”. Apesar do acidente com um de nossos navios, a viagem transcorreu, até o momento, sem grandes sobressaltos, conforme relato do correspondente. Não se teve notícias de monstros ou outros acontecimentos que a mitologia ou a ignorância popular prediziam.

Quatro meses após sua partida da Terra de Santa Cruz, nosso correspondente na Índia informa a chegada da expedição na ilha de Calecute. Seguiremos, sem interrupções, com a descrição das suas observações.

“A armada portuguesa chegou a Calecute, movimentado porto comercial da costa do Malabar, localizado no sudoeste, região peninsular do Sul da Ásia em 13 de setembro de 1500, após algumas escalas no litoral leste africano. Foi possível observar na chegada que faltavam algumas embarcações. Questionando a tripulação, descobrimos que quatro navios foram perdidos ao cruzar o cabo da Boa esperança, perto do extremo sul do continente africano, que permite a ligação entre o oceano Atlântico e o Oceano Índico. Ironicamente, o comandante de um dos navios era Bartolomeu Dias, navegador que o descobrira em 1488. 

Acompanhamos a assinatura de acordo comercial entre Portugal e um potentado. Instalou-se a feitoria portuguesa para o comércio de especiarias”.

“Urgente! Informamos em edição extraordinária que nossa feitoria em Calecute foi, em 16 de dezembro, atacada pelos muçulmanos, perecendo cerca de trinta portugueses, entre os quais o recém nomeado escrivão da feitoria, Pero Vaz de Caminha. Na batalha, Sancho assumiu o comando da esquadra e protegeu Cabral dos ataques. Com o bombardeio de Calecute e aprisionamento das embarcações árabes, Pedro Álvares Cabral resolve seguir para Cochim e Cananor, onde carregou as naus com especiarias e produtos locais.

De regresso a Portugal nova escala, agora em Sofala, por sugestão de Sancho de Tovar. O seu navio, carregado de especiarias encalhou junto à ilha, sendo incendiado e posto a pique por ordem do comandante Cabral.

Finalmente chegou o grande dia. Partiram no já distante 9 de março mil e quinhentos bravos filhos de Portugal e agregados, em treze das mais modernas naus jamais construídas, carregando em seus depósitos tesouros, em seus corações esperanças de conquistas de um novo mundo, seus canhões carregados da munição da coragem e braveza dos seus soldados, seus navegadores com a certeza do rumo a seguir, seus escrivães prontos para relatar uma nova página na história da humanidade. Retornam mais de um ano depois quatro embarcações desgastadas pelas tormentas, pelas batalhas e pelos recifes, menos da metade de sua tripulação, cansados, doentes, feridos, estropiados em sua carne e alma, deixando para trás, na imensidão do mar bravio amigos, parentes, colegas. Quantos de nosso heróis sucumbiram nas batalhas e nas tempestades, um Bartolomeu Dias, célebre navegador que consegui dobrar o cabo das Tormentas; um Vasco de Ataíde, desaparecido misteriosamente; e que dizer de Pero Vaz de Caminha, cuja pena sucumbiu aos ataques dos bárbaros em território indiano, e cujo maior legado, a carta enviada ao nosso rei, é por este surrupiada de nossas vistas. E o que dizer dos heróis anônimos, as verdadeiras buchas de canhão, que pegaram em remos nas calmarias, que transportaram riquezas que nunca poderiam ser suas, que obedeceram sem questionar ordens superiores que os levariam a derrocada e morte, e que ainda agora causam o pranto de viúvas, mães, avós, pais, amigos, filhos que nunca mais os verão pisar em solo pátrio, e sem ao menos ter uma cruz onde extravasar sua dor pela perda.

Valeu a pena! Valeu a pena? Qual balanço nos apresentarão nossos fidalgos, burgueses e a realeza. O que conquistamos? Uma terra sei lá aonde com sei lá o que! Uma feitoria que não se sustentou por mais de três meses! Algumas especiarias e tesouros que não equilibram a balança das perdas humanas e materiais que tivemos! Nossos governantes precisam nos explicar e nos convencer que aventuras insensatas, delirantes e irresponsáveis como essa são realmente necessárias para o progresso e a ordem da nação portuguesa. O que faremos com esta terra “descoberta”? Quando ainda despenderemos das reservas do tesouro real, da burguesia e do nosso povo para colonizar esta “Vera Cruz”? Quantos impostos, cargos e empregos serão criados com a desculpa de ocupar este território?

Povo de Portugal, podeis ficar tranquilos pois estaremos vigilantes na defesa do vosso interesse, e nossa pena não se calará a não ser pela força bruta dos déspotas do obscurantismo. 

Podeis contar conosco.

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