1840: os farrapos perdem território
A queda de Laguna deu início ao declínio Farroupilha. O General Andréa, que havia retomado Laguna, logo é nomeado o novo Presidente Imperial da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul e Comandante do Exército Imperial na Província. Também começam as desavenças políticas entre os farroupilhas, com consequências funestas no futuro.
No começo de 1840, os farroupilhas controlavam boa parte do interior, mas não tinham uma saída para o mar. Além disso, enquantos as tropas rio-grandenses se concentravam no cerco de Porto Alegre, Caçapava, a capital da República desde 14 de fevereiro de 1839, considerada inexpugnável por causa do difícil acesso, é invadida pelos imperiais. Instala-se a capital em Alegrete, em 28 de março.
No mesmo ano, no combate de Tabatingaí, João Propício Mena Barreto e suas tropas derrotam 250 farroupilhas, prendendo Onofre Pires, levado para Porto Alegre. Em Julho os Farrapos perdem São Gabriel. Francisco Pedro de Abreu, o Moringue, surpreende Antônio de Sousa Neto quase fazendo-o prisioneiro. Finalmente Bento Gonçalves, em campanha pela conquista de São José do Norte junto com Domingos Crescêncio de Carvalho e 1200 homens, trava duríssima batalha de quase nove horas, tomando a cidade por pouco tempo. A reação vinda de Rio Grande, expulsa os farrapos embriagados.
Estes insucessos e alguns desentendimentos com Bento Gonçalves, deram pretexto a Bento Manuel, tido como fiel da balança do confronto, para abandonar os revolucionários. Escreveu ao ministro da Guerra da república, José Mariano de Mattos, demitindo-se do exército, ao mesmo tempo que escrevia para o presidente da província pedindo uma anistia para si e alguns amigos. Anistiado, foi refugiar-se no Uruguai, desiludido com o sistema republicano que, segundo ele, "parece em teoria governo dos anjos, porém na prática nem mesmo para diabos serve".
Alegoria Farroupilha, guache do século XIX. Acervo do Museu Júlio de Castilhos
Bento Gonçalves, ainda no ano de 1840, em decorrência dos insucessos, acena ao Império com a possibilidade de acordo. Bento pede a Álvares Machado salvo-condutos para que companheiros seus pudessem atravessar impunemente os locais conquistados pelo império a fim de acertar os detalhes com os chefes imperiais de uma rendição coletiva dos Farrapos. Levavam, efetivamente, uma carta com este desígnio. Porém, havia uma outra mensagem oral a ser dada àqueles líderes, que não podia ser escrita. A manobra, porém, foi tão bem pensada e executada que enganaria até mesmo seus companheiros de luta, e motivou uma carta de reprovação escrita por Domingos José de Almeida, então Vice-Presidente e Ministro da Fazenda da República Rio-Grandense.
Os combates continuam em diversas frentes: em novembro de 1841 Chico Pedro faz 20 prisioneiros e toma 400 cavalos dos Farroupilhas, perto de São Gabriel; em Rincão Bonito o coronel João Propício Mena Barreto provoca 120 mortes, faz 182 prisioneiros e toma 800 cavalos; em 20 de janeiro de 1842 Chico Pedro, atacado por Bento Gonçalves e 300 homens, derrota-o, provocando 36 mortes, 20 prisioneiros e capturando toda a bagagem, sofrendo somente 3 mortes e 7 feridos.
Uma Assembleia Constituinte havia sido convocada em 10 de fevereiro de 1840, porém manobras de Bento Gonçalves, que não queria perder poderes, levaram a que somente em 1842, fosse promulgada a Constituição da República, o que deu um ânimo momentâneo à luta.
Reforços Liberais
Rebeliões em outras províncias, como a Sabinada na Bahia e a Revolução Liberal de 1842 em São Paulo, trazem novos reforços às tropas farrapas. Entre eles, vieram da Bahia:
- Daniel Gomes de Freitas (signatário depois do tratado de paz)
- coronel Manoel Gomes Pereira, que financiou a fuga de Bento Gonçalves. Saiu da Bahia no inicio de janeiro de 1838, estava em Montevidéu em missão de recrutamento quando a Sabinada acabou e dali foi procurar seus amigos riograndenses, sendo bem acolhido e presenteado por Bento Gonçalves com o posto de coronel, servindo no Estado Maior. Veio com uma fortuna arrecadada para comprar barcos de guerra, que jamais navegaram, mas adquiriu uma chácara em Montevidéu, depois de cobrar de Bento o dinheiro que tinha lhe emprestado.
- João Rebelo de Matos, Bento José Roiz, José Pinto Ribeiro, João Francisco Régis, militares todos transferidos da Bahia e envolvidos na Sabinada e que se rebelaram na Fortaleza da Barra do Sul, na Ilha de Santa Catarina, entregando a fortaleza aos Farrapos e se juntando ao movimento, em 1839.
- Francisco José da Rocha, teria vindo da Bahia acompanhando Bento Gonçalves, era a maior autoridade maçônica na Província; sua promoção a tenente-coronel pelos farroupilhas e foi um dos motivos que levou Bento Manuel a abandonar o lado republicano.
- João Rios Ferreira
De São Paulo veio Rafael Tobias de Aguiar.
Por outro lado, o fim destas outras rebeliões, também liberaram as tropas do exército brasileiro para concentrarem todos seus esforços contra os farroupilhas.
Intrigas : O duelo entre Bento Gonçalves e Onofre Pires
A República Rio-Grandense não ficou isenta das disputas pelo poder. Começaram a aparecer em sua fileiras pessoas inteligentes e capazes, dispostas a rachar a necessária unidade nacional naquele momento em que a nação gaúcha precisa de todas as suas forças para combater um inimigo reconhecidamente superior em número e riqueza. Em Dezembro de 1842, quando se instalou a Assembleia Constituinte Farroupilha, as divergências se exteriorizaram, contrapondo a “maioria” de Bento Gonçalves e contra a "minoria" de Antônio Vicente da Fontoura. Isto levou o projeto de Constituição publicado em fevereiro de 1843, a ter prejudicada a sistematização das ideias de todos aqueles que ainda estavam na revolução ou a apoiavam.
Em 4 de agosto de 1843, Bento Gonçalves renunciou à presidência da República Riograndense por conta de uma campanha de intrigas, assumindo seu vice Gomes Jardim. Lançou ao mesmo tempo um manifesto dizendo-se acometido de uma enfermidade pulmonar, que talvez já o estivesse incomodando, e incita os farroupilhas a se unir em torno do novo presidente. Passa em seguida a comandar uma divisão do Exército Rio-Grandense.
Os opositores, entre eles o deputado Antônio Vicente da Fontoura, induzem Onofre Pires a destratar Bento Gonçalves, acusando-o do assassinato de Paulino da Fontoura. Onofre foi por isso desafiado por Bento para um duelo, realizado em 27 de fevereiro de 1844, sendo ferido no braço direito, apesar de socorrido por Bento, falece dias depois, por complicações advindas daquele ferimento.
Negociações de paz e a batalha de Porongos
Um dos canhões usados pelos Farroupilhas. (Permaneceu até 1926 no fundo do riacho Santa Isabel, em Camaquã, quando foi recuperado junto com outros e passou ao acervo do Museu Júlio de Castilhos)
A primeira negociação de paz, ocorreu com a nomeação de Francisco Alves Machado para presidente da província, este ofereceu a Bento Gonçalves anistia plena para negociar um tratado. Bento respondeu em carta , a 7 de dezembro de 1840, propondo que : as dívidas contraídas pela república fossem pagas pelo governo imperial; os escravos que haviam sido alistados como soldados republicanos fossem libertados e que os oficiais revolucionários fossem garantidos em seus postos, quando aproveitados em serviço da Guarda Nacional. Para melhor firmar o tratado, Bento Gonçalves solicitou uma conferencia com o presidente, porém Alvares Machado negou-a por saber que os farrapos tentavam aliciar à sua causa diversos legalistas, como o coronel Manduca Loureiro e coronel João da Silva Tavares. A recusa da conferencia importou em suspensão da anistia e consequente continuação da luta.
O sistema de guerrilha e a troca constante de presidentes e comandantes de armas prolongaram a luta até que o Barão de Caxias (futuro Duque) foi nomeado Presidente da Província e Comandante Supremo Imperial em 9 de novembro de 1842, reorganizando o exército e chamando para seu Estado Maior a Bento Manuel Ribeiro, que tinha se recolhido para o Uruguai. O barão empregava toda sua força de 12 000 homens, conhecimento inteligência e experiência para minar a relativa supremacia farrapa no interior, que contava com apenas 3500 homens. Entre as várias ações, iniciou uma campanha de estrangulamento da economia da República, atacando as cidades da fronteira que permitiam o escoamento da produção de charque para Montevidéu e Laguna; comprando cavalos para impedir que os Farrapos tivessem montaria; reativando o comércio.
Lima e Silva, porém não conseguiu atrair os farrapos para uma batalha campal decisiva. O exército republicano, sabendo de sua inferioridade numérica e de armamentos, evitou o combate direto, tendo a campanha permanecido como uma série de pequenos combates e escaramuças, quando perseguidos os farroupilhas se refugiavam no Uruguai.
Em 1844, Fructuoso de Rivera propôs intermediar a paz entre legalistas e republicanos. Manuel Luís Osório foi enviado ao acampamento de Rivera, onde encontrou-se com Antônio Vicente da Fontoura, para avisar que Lima e Silva recusava a proposta de paz, mas que poderia haver tratativas com o governo, porém sem a presença de terceiros. Vicente da Fontoura foi enviado à corte para discutir a paz.
Luís Alves de Lima e Silva recebeu instruções do Império, que temia o avanço de Rosas sobre o território litigante, para propor condições honrosas aos revoltosos, como: a anistia dos oficiais e homens, sua incorporação ao Exército Imperial nos mesmos postos, e a escolha do Presidente da Província pela Assembleia Provincial, taxações sobre o charque importado do Prata.
Entretanto, uma questão permanecia insolúvel, a dos escravos libertos pela República para servir no exército republicano. Para o Império Brasileiro, era inaceitável reconhecer a liberdade de escravos dada por uma sedição, embora anistiasse os líderes da mesma revolta.
Em Novembro de 1844, estavam todos em pleno armistício. Suspensão de armas, condição fundamental para que os governos pudessem negociar a paz. Por isso o relaxamento da guarda no acampamento da curva do arroio Porongos. Canabarro e seus oficiais imediatos foram a uma estância próxima visitar a mulher viúva de um ex-guerreiro farrapo. O coronel Teixeira Nunes e seu corpo de Lanceiros Negros descansavam. Foi então que apareceu Moringue, de surpresa, quebrando o decreto de suspensão de armas. Mesmo assim o corpo de Lanceiros Negros, cerca de 100 homens de mãos livres, pelearam, resistiram e bravamente lutaram até a aniquilação, em uma posição de difícil defesa. Além disso foram presos mais de 300 republicanos entre brancos e negros, inclusive 35 oficiais.
O general Canabarro, recuperado, reuniria ainda todo o restante de seu exército, cerca de 1.000 homens, e atacaria Encruzilhada a 7 de dezembro de 1844, tomando-a e mostrando assim que a sua intenção não era entregar-se.
Paz do Poncho Verde
Por fim, a 1 de Março de 1845, assinou-se a paz: o Tratado de Poncho Verde ou Paz do Poncho Verde, após quase dez anos de guerra que teria causado 47829 mortes. Entre suas principais condições estavam a anistia plena aos revoltosos, a libertação dos escravos que combateram no Exército piratinense e a escolha de um novo presidente provincial pelos farroupilhas. O cumprimento parcial ou integral do tratado até hoje suscita discussões. A impossibilidade de uma abolição da escravatura regionalmente restrita, a persistência de animosidade entre lideranças locais e outros fatores administrativos e operacionais podem ter ao menos dificultado, senão impedido o cumprimento integral do mesmo. Tal discussão é remetida para o artigo principal deste assunto.
Dos escravos sobreviventes, alguns acompanharam o exército do general Antônio Neto em seu exílio no Uruguai, outros foram incorporados ao Exército Imperial e muitos foram vendidos novamente como escravos no Rio de Janeiro.
A atuação de Luís Alves de Lima e Silva foi tão nobre e correta para com os oponentes que a Província, novamente unificada, o indicou para senador. O Império, reconhecido, outorgou ao general o título nobiliárquico de Conde de Caxias (1845). Mais tarde, (1850), com a iminência da Guerra contra Rosas seria indicado presidente da Província de São Pedro do Rio Grande.
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